segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Porque revisitar a História de Nova Iguaçu?
Marize Conceição de Jesus¹A forma de se produzir História vem mudando desde o início do século XX. Vários foram os debates que se seguiram nas academias e muitos foram os historiadores que buscaram uma nova forma de escrever história, que não fosse a história positivista, baseada em fatos e determinada por uma ordem linear e cronológica, a história política dos grandes feitos e dos grandes homens.Da história econômica de Marx à história problema da Escola dos Analles, há muito os historiadores vêm buscando preencher as lacunas deixadas tanto pela História Política, quanto pela História Econômica, procurando dar voz as massas anônimas, pautando-se em uma postura interdisciplinar, que abordem temas ligados a vida cotidiana, produzindo História, preocupados com a pesquisa e com a busca de novas fontes variadas, em especial os relatos orais. Estes, usados como fonte de pesquisa, nos permitem fazer um contraponto com um discurso corrente que não reconhece as versões diferenciadas a respeito de um determinado fato. Com os relatos orais é possível reconstruir as diversas histórias de vida que no seu conjunto permitem olhar para a história oficial a partir de um outro ângulo, de uma nova ótica que efetivamente nos permitirá compreender e problematizar o fato estudado.(...) “preocupando-se com a história dos indivíduos, das comunidades “pequenos enredos construídos a partir de tramas aparentemente banais, envolvendo gente comum.” Neste contexto, Nova Iguaçu e a Baixada Fluminense contam hoje com algumas pesquisas (monografias, dissertações, teses) produzidas nas mais diversas áreas do conhecimento, que de alguma forma mostram não apenas os interesses econômicos e políticos de uma elite agrária e comercial, mais a luta pela sobrevivência de índios, escravos, meeiros, negros, nordestinos, mulheres, forasteiros , que através de seu trabalho, construíram a Nova Iguaçu de hoje.Durante muito tempo, a pesquisa sobre a história de Nova Iguaçu esteve embasada nos chamados ciclos econômicos e nos grandes feitos de seus ilustres moradores: proprietários de terras, a elite econômica e política, endeusados como os grandes benfeitores da região . Textos repletos de ufanismos que buscavam inserir a história local, na história do Brasil (através da relação dos coronéis da região com o Império, e da importância econômica desta para a capital imperial) , análises generalizantes que passavam longe das relações sociais particularizadas que foram se formando e que a partir delas se construiu a sociedade iguaçuana, composta não só de uma elite sócio econômica, mas, principalmente de outros agentes sociais: índios, escravos, negros, nordestinos, mulheres, artistas. Se os primeiros já são alvos de pesquisas, cabe agora, aos pesquisadores: historiadores, geógrafos, sociólogos, entre outros, dar voz a outros agentes sociais. “uma multiplicidade de narradores, testemunhas nunca ouvidas de uma história social, porém, ocultos das fontes “oficiais”de pesquisa...Reinterpretar o passado à luz das memórias individuais e coletivas...de agentes históricos que viveram ou participaram direta ou indiretamente de determinados períodos da história nacional, porém alijados da mesma.” “ No sentido mais geral, uma vez que a experiência de vida das pessoas de todo tipo possa ser utilizada como matéria-prima, a história ganha nova dimensão (...)(...) reconhecendo grupos importantes de pessoas que haviam estado ignoradas, dá-se início a um processo cumulativo de transformações. Amplia-se e enriquece o próprio campo de ação da produção histórica, e, ao mesmo tempo, sua mensagem social se modifica. Para ser claro, a história se torna mais democrática.” Hoje, ainda que nadando contra a maré dos que se postaram como “guardiães da memória da Baixada Fluminense”, alguns pesquisadores vêm se debruçando sobre a história de outros personagens, buscando dar voz aos supostos vencidos, desta forma dando outras versões para os fatos históricos, reconstruindo a história da Baixada e de Nova Iguaçu sob uma nova ótica. Entendemos que é demasiado importante pesquisar mais sobre os povos nativos desta região, e as relações travadas com os mesmos. Falar dos tropeiros, homens livres e pobres que com seu trabalho ajudaram na expansão e integração regional e econômica desta região; pesquisar sobre escravos e negros e de que forma estes sobreviveram nesta região a ponto de torná-la uma das maiores em população negra do país .Nova Iguaçu durante muito tempo foi exaltada como “ cidade perfume” e os grandes produtores de laranjas como os responsáveis por colocar a cidade nos rumos da modernidade . No entanto, pouco se falou nos trabalhadores, sitiantes e meeiros que trabalhavam diretamente na produção de laranja e de como alguns ficaram sem moradia e sustento a partir da crise da citricultura e da expansão dos loteamentos e do crescimento populacional ocasionado por este fator. Falar da população que veio para esta região, na sua maioria nordestinos, operários nas indústrias do Rio de Janeiro, seduzidos pelas facilidades dos loteamentos ou dos financiamentos de casas nos conjuntos habitacionais que vão aos poucos criando uma outra paisagem para Nova Iguaçu, abrindo ruas, criando bairros, se organizando na igreja, em associações de moradores, nos sindicatos e desta forma peculiar vão trazendo melhorias para as comunidades na medida em que o poder público se isenta de suas responsabilidades. Entendemos que a história de Nova Iguaçu está repleta de silêncios, de não ditos que precisam ser elucidados, uma vez que temos uma região complexa, formada pela dualidade de grupos sociais distintos, cujas relações conflituosas não necessariamente estiveram presentes nos escritos históricos a respeito da região, e que nestes, assim como na história do Brasil, prevaleceram a versão daqueles que detinham o poder político-econômico em detrimento dos outros atores sociais que buscaram formas de sobrevivência em meio as dificuldades e rupturas e a necessidade de superar a segregação e a exclusão social lhes impostas. Um dos caminhos trilhados em nossa pesquisa foi o registro da memória dos personagens anônimos que construíram a História de Nova Iguaçu e da Baixada Fluminense. A memória dos moradores, dos atores sociais, descortinam identidades particularizadas e inúmeros conflitos nos quais se assentaram a história desta localidade. Democratizar a história da Baixada Fluminense e de Nova Iguaçu, revisitá-la, fazer uma releitura nos documentos, nas fontes escritas, retirar delas estes agentes que passaram despercebidos a uma primeira leitura. Buscar relatos que possam trazer a tona fatos que nos permitam outra compreensão, outro olhar a respeito da história desta localidade.É a partir desta breve análise que nos propomos pesquisar a história de Nova Iguaçu e deste modo contribuir para o entendimento das múltiplas realidades que formaram a história de nossa cidade.¹- Especialista em História Social do Brasil/Profª da rede pública estadual

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