quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Que cidade queremos?

Na última sexta-feira, dia 25, Sérgio Ferreira Pinto Junior manteve Ana Cristina Garrido como sua refém em uma esquina do bairro de Vila Isabel, na cidade do Rio de Janeiro. Sérgio tomou Ana Cristina como refém após tentar roubar um carro na mesma rua onde, por quarenta minutos e tendo uma granada nas mãos, a manteve rendida. O final trágico da curta história que envolveu Sérgio, Ana Cristina e mais 50 policiais militares é conhecido por todos. Um atirador de elite da PM disparou contra o assaltante um tiro certeiro, atingindo-o na cabeça e libertando imediatamente a refém.A imagem de Sérgio sendo atingido na cabeça foi amplamente reproduzida na televisão, em jornais impressos e, claro, na internet. Foi noticiado ainda que, após o disparo e a libertação de Ana Cristina, as pessoas que acompanhavam as negociações na rua aplaudiram o desfecho da história. A operação foi considerada um exemplo de sucesso pelos cidadãos que ali estavam, sem dúvida, aliviados com a libertação da refém. Mas também pelo governador do Estado, que no dia seguinte exaltou o comando da polícia carioca, o secretário de segurança pública e definiu a ação como “a antítese do 174”, referindo-se ao sequestro do ônibus da linha 174 que ocorreu há 9 anos. Na ocasião, o final foi bem diferente, uma das reféns morreu, assim como o sequestrador. Para o governador, a antítese daquele desfecho, ou seja, o contrário da tragédia toma forma na história de Sérgio e Ana Cristina, onde tudo acaba com um tiro na cabeça do assaltante. Não cabe aqui julgar se a ação da polícia no dia 25 foi correta ou não, este não seria o espaço para uma avaliação como essa. No entanto, os fatos que ocorreram em Vila Isabel podem servir para que os cidadãos cariocas se questionem sobre qual é a cidade que desejam e como essa cidade pode ser construída. A cidade que queremos é a cidade que aplaude a morte de um jovem de 24 anos, sem pensar na dor da família e sem saber quem era esse jovem? A cidade que desejamos vai ser construída com atiradores de elite em cada janela e com uma polícia que tem a letalidade como indicador de eficiência? Ou ainda, queremos passar os nossos dias assistindo à trágica cena que certamente não sairá de nossas mentes do boné que cai atrasado por inércia após um disparo que atinge a cabeça de um cidadão? Ou o que desejamos é nem lembrar que Sérgio era um cidadão? Se as respostas a essas questões forem afirmativas, parece que estamos no caminho certo e o desfecho do assalto de Vila Isabel é ilustrativo.No entanto, estes, certamente, não são os desejos dos cidadãos cariocas. Não é difícil constatar como são muitos aqueles que acreditam que a vida humana é mais importante que o combate ao crime. A morte de Sérgio e os fatos que a ela se sucederam demonstram que a luta pela valorização da vida e por uma política de segurança cidadã são mais do que atuais. Pois não há sociedade pacificada onde segurança pública se faz com base na letalidade. Do contrário, acabamos por perder sempre, para usar da infeliz metáfora do coronel Fernando Príncipe, comandante do batalhão da PM da Tijuca que, ao final da operação, questionado sobre o sucesso da ação da PM, afirmou que felizmente o desfecho do assalto em Vila Isabel foi diferente do ocorrido no ônibus 174, sequestro no qual ele também estava presente. “O policial errou o tiro. (...) Sandro acabou atirando e matando a refém. O Brasil não perdeu uma Copa do Mundo porque o Zico chutou um pênalti para fora? O policial atirou e errou. Perdemos”, afirmou ele. O que parece, no entanto, é que estamos perdendo seguidamente. Perdemos vidas. Perdemos a chance de fazer desta cidade um lugar de justiça e utopias.